A REINVENÇÃO SONORA PROPOSTA PELO IAKEKAN
A partir de sua estreia no ano passado em apresentação encomendada para o encerramento do VIII Seminário Internacional de Direitos Humanos da UFPB e depois de um período de aprofundamento de pesquisa e maturação da malha sonora, o Iakekan retorna aos palcos para duas apresentações e duas oficinas com projeto contemplado no edital de circulação do Fundo de Incentivo à Cultura (FIC-PB).
Em sua seleção de cantigas e instrumentais do repertório latinoamericano, tanto do interior quanto do ambiente urbano, o grupo revisita canções que são verdadeiros achados, alinhando-se à performance de expressões minoritárias e a um arquivo musical resistente. Estão presentes músicas da cultura dos parakanã, dos quilombos, quechua e mapuche, ao lado de canções de compositores locais, MPB, da nueva canción chilena e argentina, contemplando nossa diversidade. O timbre resultante do tratamento acústico confere um certo teor de originalidade à proposta da trupe, evidenciando-se pelo uso de flautas (kena, sikuri, tarka, ocarinas), cordas andinas (charango, cuatro venezuelano e guitarrón), berimbau, marimbau, rabeca nordestina, harpa celta e tanajura.
O trabalho está comprometido com a miscigenação do espaço latinoamericano, tramado em séculos de injustiças, desmandos, violações, dispositivos autoritários e violências físicas e simbólicas, mas de fertilidade cultural generosa. Deve ser assinalada como marco inspirador a experiência de Alice Lumi Satomi, nos idos anos das décadas de 70 e 80, em suas andanças com o grupo Tarancón, de São Paulo, e o grupo Etnia, de João Pessoa. Neste e na formação atual, ladeando-se a contribuições primorosas de artistas experimentados, como Paulo Ró, autor de duas das músicas do repertório, e Fernando Pintassilgo, que já tocou até com o grupo Água, do Chile. Some-se a este naipe inventivo, a sensibilidade de jovens músicos e cantores que demonstram especial afinidade com a empreitada, sejam professores, bolsistas ou aficionados da etnomusicologia.
Que este projeto e este som estejam sendo realizados nas dependências do Centro de Comunicação, Turismo e Artes da UFPB é um feliz alento, pois assim está delineada uma reconfiguração da música e da cultura do outro, através de idiomas, ritmos e instrumentos das culturas minoritárias. Tal caldeirão artístico que aqui é reinventado está muito bem alicerçado em bases conceituais e pela criatividade e comprometimento dos integrantes do Iakekan (“canto que vem do céu”) - para embalar nossos ouvidos que outrora foram mais musicais, mas hoje parecem cansados de tanto ruído!
Carlos Magno Fernandes (Decom – UFPB)
Ficha técnica
Alice Lumi: roteiro, direção, charango, violão, teclado, tarka, siku
Fernando Farias: kena, flauta, gaita de índio, tarka, mbira, marimbau
Paulo Ro: violão, mbira, percussão
Maria Juliana Linhares e Fabio Xavier: canto
Joao Nicodemos Mayara Yuri: rabeca
Esdras Sarmento: guitarron, berimbau, percussão
Renan Mendes: harpa céltica, canto e flauta
Daniel Munoz: canto, cuatro venezuelano
Valeska Picado: direção cênica
Mylena Alves de Lavor: Arte final